quinta-feira, 12 de outubro de 2023

O caso dos dados astrômicos, Tycho Brahe e Johannes Kepler

     Dois modelos de mundo dividiram opiniões por séculos: modelo Ptolomaico e o Modelo Copernicano. O modelo Ptolomaico foi formulado por Claudius Ptolomeu no final do séc I d.C., onde explica o movimento dos astros conhecidos na época tendo a Terra como o centro e o Sol, a Lua, os planetas e as estrelas girando em torno da Terra em esferas específicas. Já o modelo Copernicano, teve início com um astrônomo grego Aristarco de Samos, por volta do séc III a.C., sendo refinado matemáticamente por Copérnico em 1543, onde o Sol se posiciona no centro e a Terra e os planetas girando em volta do Sol. Durante todos esses séculos os dois modelos disputaram apoiadores, sendo que a Igreja Católica adoto o modelo Ptolomaico por este ser mais fiel às escrituras sagradas.

    Se o sistema héliocentrico já era conhecido antes de Cristo, por quê houve essa disputa durante séculos entre os dois sistemas?  Um dos principais fatores desta questão ter durado séculos eram os dados. Ou melhor, nesse caso os dados coletados até então eram imprecisos. As ferramentas para medir dados astronômicos até o final da idade média eram muitos precários, fazendo com que os dados tivessem uma alta incerteza, e assim poderiam ser "ajustados" facilmente em qualquer um dos dois modelos.

    Para termos uma ideia, a incerteza das medições astronômica na época medieval era de dezenas de minutos de graus. Para entender essa unidade é necessário "dividir" toda a abóboda celeste por 360 (já que a volta completa é 360°). Cada grau é dividido por 60, o que dá os minutos de graus, e fazendo o mesmo para segundos. A lua ocupa no céu 1/2 grau, ou seja, 30 minutos de grau. Então a incerteza dos instrumentos medievais chegavam quase ao diâmetro da lua, o que é bem grande (atualmente a incerteza está abaixo de 0,1 segundos de arco).

    E foi aí que, no início da renascença, surgiu um astrônomo decidido a acabar com esse problema. O astrônomo dinamarquês Tycho Brahe dedicou sua vida à construir os melhores e mais acurados equipamentos astronômicos, e coletar a maior quantidade possível de dados das posições dos astros por um grande período. Ele realizou observações detalhadas e precisas das posições dos planetas e de outras estrelas ao longo de quase de 20 anos. Tycho Brahe era Geocentrista e achava que com seus dados precisos ele iria finalmente conseguir provar que era o sol que girava em torno da Terra, e não o oposto. Infelizmente (ou felizmente, dependendo do ponto de vista), Tycho faleceu antes de ver o resultado de seus dados.

    Para poder entender o que seus dados diziam, Tycho precisou contratar um matemático para realizar os cálculos de sua imensa quantidade de dados coletados. Então ele contratou um hábil matemático chamado Johannes Kepler (sim, apesar dele ser conhecido por suas leis da astronomia, Kepler era matemático e não um astrônomo) para realisar essa árdua tarefa. Pouco tempo após a contratação Tycho veio a falecer deixando o jovem Kepler com seus dados coletados por 20 anos, e Kepler começou então a tarefa de cálcular as órbitas dos astros e decidir que modelo eles se encaixavam.

    Após muito tempo (e muitos cálculos) Kepler viu que eles não se encaixavam no modelo Geocentrico de Ptolomeu. Porém o modelo de Copérnico também não se encaixou perfeitamente nos dados calculados, foram necessários alguns ajustes no modelo de Copérnico (como alterar as órbitas circulares para elípticas) para que o modelo ajustasse com os dados observados.

    Esse caso ilustra a importância da precisão e qualidade dos dados coletados, e como dados ruins podem gerar resultados ruins (obviamente). E tão obvio quanto é que todos os passos da ciência de dados são igualmente impotantes, cada etapa do processo científico, incluindo a coleta, análise e interpretação de dados, desempenha um papel crítico na obtenção de resultados confiáveis. Qualquer descuido em uma das fases poderá (e irá) influenciar no resultado final.