segunda-feira, 28 de novembro de 2011

POESIA MATEMÁTICA (Millôr Fernandes)

Um Quociente apaixonou-se
Um dia
Doidamente
Por uma Incógnita.
Olhou-a com seu olhar inumerável
E viu-a, do Ápice à Base…
Uma Figura Ímpar;
Olhos rombóides, boca trapezóide,
Corpo ortogonal, seios esferóides.
Fez da sua
Uma vida
Paralela à dela.
Até que se encontraram
No Infinito.
“Quem és tu?” indagou ele
Com ânsia radical.
“Sou a soma do quadrado dos catetos.
Mas pode chamar-me Hipotenusa.”
E de falarem descobriram que eram
- O que, em aritmética, corresponde
A alma irmãs -
Primos-entre-si.
E assim se amaram
Ao quadrado da velocidade da luz.
Numa sexta potenciação
Traçando
Ao sabor do momento
E da paixão
Retas, curvas, círculos e linhas sinoidais.
Escandalizaram os ortodoxos
Das fórmulas euclideanas
E os exegetas do Universo Finito.
Romperam convenções newtonianas
E pitagóricas.
E, enfim, resolveram casar-se.
Constituir um lar.
Mais que um lar.
Uma Perpendicular.
Convidaram para padrinhos
O Poliedro e a Bissetriz.
E fizeram planos, equações e
Diagramas para o futuro
Sonhando com uma felicidade
Integral
E diferencial.
E casaram-se e tiveram
Uma secante e três cones
Muito engraçadinhos.
E foram felizes
Até àquele dia
Em que tudo, afinal,
Se torna monotonia.
Foi então que surgiu
O Máximo Divisor Comum…
Frequentador de Círculos Concêntricos.
Viciosos.
Ofereceu-lhe, a ela,
Uma Grandeza Absoluta,
E reduziu-a a um Denominador Comum.
Ele, Quociente, percebeu
Que com ela não formava mais Um Todo.
Uma Unidade.
Era o Triângulo,
Chamado amoroso.
E desse problema ela era a fracção
Mais ordinária.
Mas foi então que Einstein descobriu a
Relatividade.
E tudo que era expúrio passou a ser
Moralidade
Como aliás, em qualquer
Sociedade.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Google

Gugol (google ou googol) é o número 10¹ºº, ou seja, 1 seguido de 100 zeros.

Esse nome surgiu quando em certa ocasião, o matemático americano Edward Kasner, em 1938, perguntou ao seu sobrinho de 9 anos, Milton Sirotta, qual era o maior número que existia. A resposta do menino (algo como guuugol) não foi muito animadora, mas na mente de Kasner isso virou uma bela brincadeira. Em homenagem ao sobrinho, ele chamou de gugol ("googol", em inglês) o número 1 seguido de 100 zeros ou, dizendo de outra forma, o número 10 elevado a 100.
Edward Kasner apresentou o googol em seu livro "Matemática e Imaginação". O googol é "aproximadamente" igual ao 70! (fatorial de 70). No sistema binário, seriam necessários 333 bits para representá-lo.

Em seguida, usou o gugol como base para denominar um número ainda maior: o gugolplex, que equivale a "10 elevado a 1 gugol". Imagine quantas folhas de papel seriam necessárias para escrever o número gugolplex por entenso.
Também existe as figuras geométrica gugólgono e gugoledro. Gugólgono é uma polígono com um gugol de lados e o gugoledro é um poliédro com um gugol de faces.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Biologia Quântica: a mecânica quântica da fotossíntese

     Biologia quântica? Mas a física quântica já não era complicada o suficiente? Alguns cientistas da Universidade de Toronto resolveram complicar mais ainda, e dizem terem observado processos de mecânica quântica na fotossíntese de uma alga marinha.
     Complexos coletores de luz são usados na fotossíntese para capturar a luz solar e convertê-la em energia para a planta. Os cientistas dizem terem estudado algas em temperaturas mais baixas, com uma tecnologia complexa de laser.
      Eles estimularam as algas com o laser, imitando a luz solar. Isso deu aos especialistas a chance de monitorar as atividades das algas após a absorção da energia com mais tempo. Qual não foi a surpresa deles quando eles descobriram que, para que a luz seja transformada em proteína, há todo um processo quântico?
O estudo sugere que a energia gerada fica em dois lugares ao mesmo tempo (propriedade da mecânica quântica, chamada sobreposição quântica).
      Esses resultados levantam algumas questões fascinantes: será que as plantas evoluíram de forma a usar as leis quânticas por isso se tornar uma vantagem evolucionária? Será que as plantas entendiam as leis quânticas dois bilhões de anos antes que nós?

Fonte: Hyperscience

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Livro: O Universo numa Casca de Noz, de Stephen Hawking

     Olá pessoas! Neste post vou falar um pouco sobre o livro O Universo numa Casca de Noz, escrito pelo brilhante matemático, astrofísico e doutor em cosmologia Stephen Hawking. Esse foi o primeiro livro do gênero que li, e o motivo de me apaixonar pela física. Neste livro ele propõe suas idéias, com uma linguagem simplificada, e apresenta de forma mais atraente diversos segmentos da física teórica.
     Apesar do tema do livro não ser dos mais o populares,  esse livro foi escrito direcionado para o público em geral. O livro contém um total de 7 capítulos, os 2 primeiros capítulos fazendo uma pequena introdução e revisão da ciência até os dias de hoje, e os seguintes capítulos abordando os temas mais atuais da ciência de forma independente, quem não conseguir entender um dos seguintes capítulos, pode ler o seguinte pois não depende do anterior.
     O livro inicia falando de como  a Teoria da Relatividade de Einsten mudou o mundo, mas não sem antes revisar os conceitos fundamente da física newtoniana. Na sequência Hawking descreve a Forma do Tempo, como mudou a visão sobre o Tempo e a união do Espaço com o Tempo. No capítulo seguinte o escritor aborda o tema de múltiplas histórias do universo e as múltiplas formas do universo. O quarto capítulo fala sobre previsões do futuro, como o determinismo de newton falhou em fazer essas previsões. O capítulo cinco toca na possíbilidade de viagens no tempo. No capítulo seguinte o autor especula o futuro da vida biológica e eletrônica. E no último capítulo, fala da possibilidade de vivermos dentro de membras, ou de todos sermos hologramas.

     Nessa viagem ,o leitor é apresentado a gênios responsáveis pelos muitos avanços da Física, dando grande destaque à física teórica e moderna. Albert Einstein, Richard Feynman, James Maxwell, Max Planck, Roger Penrose (muito citado por ser seu parceiro em teorias e descobertas como os Teoremas de singularidade Penrose-Hawking), Isaac Newton, Edwin Hubble, Grassman, entre outros, são alguns dos estudiosos que aparecem como personagens essenciais no livro, e suas teorias e conclusões como a experiência de Michelson-Morley, o paradoxo dos gêmeos, a constante cosmológica, buracos negros, teoria quântica, singularidades, princípio da incerteza, o conceito de tempo, teoria de Yang-Mills, álgebra de Grassmann, teoria das cordas, as "p-branas", supergravidade com 11 dimensões, teoria do tempo imaginário, holografia, entropia e muito mais, são explanadas de modo simplório e divertido pelo professor Hawking.
     O título do livro foi inspirado em uma obra de Shakespear.  "Eu poderia viver recluso numa casca de noz e me considerar rei do espaço infinito..." em sua obra "Hamlet" ,ato 2,cena 2. Trecho muito citado por Hawking em sua obra, que em sua concepção significa que não devemos ficar reclusos em nosso próprio "universo", e sim expandindo nossos pensamentos ao infinito,o que cai bem a sua área, a física teórica.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

É possível reverter a Entropia total do Universo????

     Olá pessoal! Quem quer ganhar 1 bilhão de dólares??? É simples, basta responder a pergunta: "É possível reverter a Entropia total do Universo?". Essa pergunta foi feita no conto do escritor de ficção científica Isaac Asimov, chamado "A Última Pergunta". Mas que diabos é Entropia??? Entropia é outro monstro incompreensível da física, parte por não ser um tema abordado no colégio regular, e parte por ser incompreensível mesmo. Para podermos entender oque é Entropia, precisamos entrar em temas como Energia e Calor.
     Bom, a entropia é uma grandeza que relacionada com a Teoria da Termodinâmica (estudo do calor). E é impossível falar em entropia sem falar no pai desse monstro, Rudolf Julius Emmanuel Clausius. Antes dele, os físicos tinham começado a compreender os complexos comportamentos da terra, do ar e da água; mas seria Clausius, em 1850, o primeiro a descobrir a verdadeira natureza do fogo, talvez o mais misterioso de todos os elementos enunciados por Aristósteles.
Só pra dar vontade
     O calor é apenas um tipo de energia. Existem também a energia elétrica, cinética, e muitas outras. A energia é vital para a civilização. Durtante 99,9% da existência humana, as sociedades primitivas foram nômades, dependendo da caça e coleta de frutos para subsistir numa vida de muita escassez. A vida era brutal e curta. A energia disponível para nós era um quinto de um cavalo-vapor, ou seja, a potência de nossos próprios músculos. Análises de ossos de nossos ancestrais mostram evidências desse enorme desgaste.
     Mas passada a última era glacial, há cerda de dez mil anos, descobrimos a agricultura e domesticamos os animais, especialmente o cavalo, gradualmente elevando nossa produção de energia a um ou dois cavalos-vapor. Isso deu início a primeira grande revolução da história. Com cavalos e bois, o homem tinha energia para arar um campo inteiro sozinho, viajar dezenas de quilometros num dia ou para carregar centenas de quilos de pedras e grãos de um lugar para outro. Pela primeira vez na história, as famílias tinham excedente de energia e o resultado foi a fundação de nossas primeiras cidades. A sociedade podia agora se dar o luxo de sustentar uma classe de artesãos, arquitetos, construtores e escribas. Logo grandes pirâmides e impérios foram erguidos nos desertos e selvas.
     Então, há cerca de trezentos anos, aconteceu a segunda revolução. Com a chegada das máquinas e da força a vapor, a energia disponível para uma única pessoa subiu para dezenas de cavalo-vapor. Utilizando locomotiva a vapor, as pessoas podiam atravessar continentes inteiros em poucos dias, máquinas podiam arar milhares de quilometro de campo e permitir a construção de imensos aranha-céus. Hoje estamos em meio da terceira revolução, a da informação. Com a população crescendo cada vez mais e o nosso voraz apetite por eletricidade e potência, nossas necessidades de energia aumentaram vertiginosamente e nosso suprimento de energia está sendo levado ao limite. A energia disponível para um único individuo agora é medida em milhares de cavalo-vapor.
     Em todo universo existem apenas dois tipos de processos. Os reversíveis, que cujas consequências se podem revogar, e o irreversíveis, que têm consequências impossíveis de revogar. Por serem perfeitamente revogáveis, os processos reversíveis podem desenrolar-se continuamente, para frente e para trás, e para frente novamente, add infinitum. Pelo contrário, os processos irreversíveis são mortais. À medida que se desenrolam, deterioram-se de alguma forma indelével. "A vida seria infinitamente mais feliz, se pudéssemos nascer com 80 anos e atingir gradualmente os 18", lamentava-se Mark Twain. Embora pudesse ser verdade, a vida era um processo irreversível.
     O filósofo seiscentista Isaac Newton notou que o caráter geral do universo aparentava ser de alguma forma reversível: os objetos rolavam pelas encostas abaixo e acima, pêndulos balançavam de um lado para o outro, as coisas explodiam e implodiam, em suma, para cada processo natural que se desenvolvia de determinada forma parecia existir outro processo natural oposto. Seria então o universo um perpetuo mobile, destinado a existir para sempre? Durante a maior parte do século XVIII, os filósofos naturalistas tenderam a responder que sim, mas nos finais de 1700, os mesmos ficaram agastados ao descobrir que o cosmos não era afinal completamente reversível: existêm vários processos para os quais não parecia haver nenhuma contrapartida oposta, e pelo menos dois deles estavam relacionado ao calor.
     Em primeiro lugar, o calor aparentava fluir sempre do quente para o frio, e nunca do frio para o quente. Por exemplo, verificava-se sempre o aquecimento da chaleira com água colocada sobra a foqueira incandescente, nunca a água ficava mais fria e a foqueira mais quente. Em segundo lugar, a fricção transformava sempre o movimento sem calor e nunca ao contrário. De fato, se acontecesse, o mundo seria um lugar estranho, onde as pedras aquecidas pelo sol começariam a mover-se por sí próprias. A existência de tais processos irreversíveis implicava que o universo estava, tal como a vida, envelhecendo.
     Clausius nasceu no dia 2 de janeiro de 1822. Precisamente neste ano, um jovem engenheiro francês dava origem a uma nova era. Após anos de trabalho, Sadi Carnot publicara sua magnum opus, Reflexões sobre a Força Motriz do Calor, a qual viria a influenciar Clausius. Tal como os franceses, os ingleses já empregavam máquinas a vapor para produção industrial. Carnot sentia-se envergonhado pelo fato das máquinas inglesas serem mais eficientes doque as francesas: para mesmas quantidades de combustível, as máquinas inglesas produziam mais trabalho.
     As máquinas a vapor queimavam madeira ou carvão para converter água em vapor. A alta pressão do vapor enchia os cilindros dos motores, empurrando os pistões para baixo, ao libertar-se o vapor sai por uma válvula de escape e os pistões voltam a posição original, repetindo esse ciclo inúmeras vezes. As máquinas a vapor eram um conjunto complexo de maquinaria, mas o efeito essencial era simples: fornecia-lhes calor e elas forneciam trabalho. Nessa época era comum pensar que a trabalho produzido dependia unicamente do temperatura da caldeira, quanto mais quente fosse, mais vapor produziria, e mais trabalho por consequência. Parecia senso comum, mas Carnot mostrou que não: em sua obra prima, ele prova que o trabalho produzido por uma máquina depende da diferença de temperatura entre a caldeira e o radiador, oque ficou conhecido como Princípio de Carnot.
     Clausius ficou surpreso também, ao descobrir que Carnot fizera outra descoberta igualmente importante. De acordo com seu princípio, uma máquina cuja temperatua entre caldeira e radiador fosse de 160 e 40 graus celsius respectivamente, produziria uma potência de cerca de 2,8 milhões de toneladas-metro por cada tonelada de carvão consumido. Todavia Carnot mediu a potência de saída de um grande número de máquinas e descobriu que os melhores engenhos ingleses produziam apenas um vigésimo daquele valor. Os franceses eram ainda piores. Simplesmente o motor ideal de Carnot representava uma máquina de movimento perpétuo (moto-perpétua). Isso vai ser assunto de outro post.
     Em 1814, um tal de Julius Robert von Mayer, nascia na Baviera. embora estivesse condenado a uma vida trágica, suas idéias mudaram para sempre a termodinâmica, formulariam a primeira lei da termodinâmica, e auxiliariam um dia a Rudolf Clausius a formular a segunda lei. Mayer foi um médico e não tinha conhecimentos de física. Enquanto jovem, estudante num seminário, ficou com a impressão de que a ciência não tinha todas as respostas. Mas tarde na faculdade de Medicina, ficou com a impressão que a religião também não tinha todas as respostas. Não satisfeito com nenhuma das duas tradições, Mayer anunciou a sua teoria sobre a criação do Mundo. No pincipio, imaginou, o universo foi criado por uma força poderosa chamada Ursache, palavra alemã para causa. Mayer afastou os teólogos por não se referir a um Deus, e os cientistas por se referir a um Ursache sobre natural.
     Foi portanto sem surpresa que foi rejeitado quando tentou problicar suas teorias no Anais de Física e Química, umas das mais prestigiadas publicações científicas da época. Enquanto trabalhava como médico a bordo de um navio holandês nas Índias Orientais, notou que o sangue dos marinheiros era muito mais vermelho quando próximo aos trópicos. Este fenônemo constituía uma validação inesperada da popular teoria calórica e das ideias de Lavoisier sobre combustão biológica. Nos países baixos, o tempo frio forçava os corpos a gerar bastante calor. Em climas mais quentes o mecanismo de combustão corporal desacelerava, consumindo menos ar inalado. O excedente de oxigênio causava e vermelhidão intensa. Ele deu um passo adiante em seu raciocínio: o esforço muscular (trabalho) também produz calor e deve haver uma relação entre trabalho e calor. Se fosse anunciada por qualquer outro esta teoria seria saudada pelos amantes da teoria calórica. Todavia, proveniente daquele jovem bávaro, a publicação suscitou pouca reação.
    Sentindo derrotado, Mayer não desistiu. Decidiu incorporar sua teoria do calor com a teoria da Ursache. De acordo com Mayer, a enorme força única se dividira em muitas forças mais pequenas, que ainda estava a se dividir. Por exemplo, a força do Sol se dividia em força luminosa e força termica, sendo ambas transformadas pelas plantas em força química (alimento). Consumido por seres vivos, essa força química se dividiria em força mecânica, força acústica, força elétrica (impulso neurais) e força térmica. Qual foi a grande conclusão de Mayer? A soma das intensidades de todas as forças divididas era igual a intensidade da Ursache original.
     A primeira lei da termo dinâmica hoje é uma das grandes lei da Física. O Calor é uma Energia. É simplesmente uma reafirmação da Lei da Conservação de Energia: a energia não é criada nem destruída, mas pode ser alterada de uma forma para outra. Mas em 1842 embora o Dr. Mayer conseguisse publicar sua teoria, ela foi amplamente ignorada. A maior parte de seus colegas rejeitou-a simplesmente pela reputação excêntrica de seu autor. O desespero do médico não deixou de aumentar nos anos seguintes, Mayer já tinha atingido o limiar da depressão e os médicos ameaçavam interna-lo num hospício. Certa noite: incapaz de dormir, saltou da cama e atirou-se pela janela do seu 2° andar. Infelizmente para si, não conseguiu suicidar-se.
     Clausius nasceu em Koszalin, na província da Pomerânia. Começou sua educação básica na escola de seu pai. Após alguns anos, fez o ginásio em Szczecin. Clausius se formou na Universidade de Berlim em 1844, onde estudou matemática e física. Ele também estudou história. Durante 1847, obteve o doutorado na Universidade de Halle sobre efeitos ópticos na atmosfera da Terra. Ele então tornou-se professor de Física na Escola Real de Artilharia e Engenharia de Berlim e professor na universidade de Berlim. Em 1855 tornou-se professor na Politécnica de Zurique, o Instituto Federal Suíço de Tecnologia, em Zurique, onde permaneceu até 1867. Durante esses anos Clausius estudou exaustivamente os trabalhos de Carnot, Joule e Mayer.
     Em 1850, publicou o artigo com nome extenso: "Sobre a força motriz do calor, e sobre as leis que podem ser deduzidas da teoria do calor". De acordo com Clausius, no caso da experiência de Joule assistia-se a transformação de energia elétrica em térmica, isto é, a medida que o fio condutor aumentava de temperatura, a eletricidade abrandava, e vice-versa. De acordo com Clausius, o Princípio de Carnot não errava ao afirmar que o trabalho ideal produzido por uma máquina era apenas determinado pela diferença de temperatura entre a caldeira e o radiador. Somente alguma parte do calor era perdida, atravessando as paredes do motor e sendo irradiado inutilmente para atmosfera. De forma similar o corpo humano, do total da energia química (alimentos), apenas uma fração era convertida em energia mecânica. Grande parte dela era convertida em subprodutos. Nenhuma máquina parecia ser capaz de funcionar sem perdas, convertendo 100% do combustível em trabalho útil.
     Apesar disto as máquinas sempre obedeciam ao princípio de conservação da energia. Desse ponto iniciou o raciocínio ao invocar dois exemplos familiares de comportamento irreversível do calor. Em primeiro lugar, o calor parecia fluir sempre do quente para o frio, e nunca ao contrário. Segundo o atrito transformava energia mecânica em calor, e não existia na natureza qualquer processo semalhante de converter calor em movimento. Esse comportamento assimétrico do calor representava dois tipos de transformação: variação de temperatura e variação de energia. Seriam essas duas variações diferentes? Ou apenas duas facetas do mesmo fenômeno? Por analogia, Clausius decidiu propor algo novo: as variações de energia e temperatura constituíam apenas duas variedades da mesma coisa, Entropia.
     A entropia aparece geralmente associada ao que se denomina, não em senso comum, de "grau de desordem" de um sistema termodinâmico. Trabalho pode ser completamente convertido em calor, e por tal em energia térmica, mas energia térmica não pode ser completamente convertida em trabalho. A segunda lei da termodinâmica diz que muitos processos na natureza são irreversíveis: o combustível queimado está perdido pra sempre, o omelete não volta para o ovo, máquinas isoladas não podem permanecer em movimento pertpétuo, e assim por diante. Em 1865, Clausious usou o termo entropia como uma medida de desordem ou aleatoriedade de um sistema. Quanto mais aleatório e desordenado, maior a entropia do sistema. O escritor de ficção científica, John Campbell, forneceu a seguinte interpretação das leis da termodinâmica:
1°- Você não pode vencer
2°- Você não pode empatar
3°- Você não pode sair do jogo
      Apesar do aspecto diferente, as variações de energia e de temperatura podiam ser comparadas com a mesma medida. Uma torrente de questões inundou a mente do físico: qual era exatamente a soma total das variações de Entropia em todo Universo? Para calcular tal empreitada, Clausius dividiu num sistema simples de contabilidade: as variações naturais(café quente esfriando) seriam tratadas como variações positivas, ou seja, a entropia aumenta. E todas variações antinaturais(geladeiras, máquinas a vapor) seriam variações negativas, então a entropia diminui. Ao analisar as máquinas e os processos, Clausius chegou a uma terrível conclusão: as variações positivas sempre excedem as negativa. Ou seja a Entropia sempre aumenta.
     Essa conclusão selou o destino do Universo: assim como o cigarro após queimado não pode se tornar cigarro novamente, as estrelas após queimarem todo seu combutível, não poderam tornar-se novamente estrela. O universo terá um fim numa melancólica vastidão escurida e fria. Claro que isto demorará alguns bilhões de anos, mas será que até lá a humanidade não descobrirá algum processo antinatural para reverter a entropia do universo? É nisso que se baseia o conto "A Última Pergunta" de Isaac Isamov, que me motivou a escrever este post. Apesar de eu não gostar de fazer post muito grande, achei que valia a pena postar aqui o conto, pois a visão do futuro da universo de Asimov, a evolução da humanidade e da tecnologia são fantástico, assim como o final surpreendente (de arrepiar) e também a resposta para a Última Pergunta.
     Espero que gostem tanto deste posto como do conto de Asimov.
     Abraços a todos!


     Bruno Martinez Ribeiro

A Última Pergunta - Isaac Asimov

A última pergunta foi feita pela primeira vez, meio que de brincadeira, no dia 21 de maio de 2061, quando a humanidade dava seus primeiros passos em direção à luz. A questão nasceu como resultado de uma aposta de cinco dólares movida a álcool, e aconteceu da seguinte forma...

Alexander Adell e Bertram Lupov eram dois dos fiéis assistentes de Multivac. Eles conheciam melhor do que qualquer outro ser humano o que se passava por trás das milhas e milhas da carcaça luminosa, fria e ruidosa daquele gigantesco computador. Ainda assim, os dois homens tinham apenas uma vaga noção do plano geral de circuitos que há muito haviam crescido além do ponto em que um humano solitário poderia sequer tentar entender.

Multivac ajustava-se e corrigia-se sozinho. E assim tinha de ser, pois nenhum ser humano poderia fazê-lo com velocidade suficiente, e tampouco da forma adequada. Deste modo, Adell e Lupov operavam o gigante apenas sutil e superficialmente, mas, ainda assim, tão bem quanto era humanamente possível. Eles o alimentavam com novos dados, ajustavam as perguntas de acordo com as necessidades do sistema e traduziam as respostas que lhes eram fornecidas. Os dois, assim como seus colegas, certamente tinham todo o direito de compartilhar da glória que era Multivac.

Por décadas, Multivac ajudou a projetar as naves e enredar as trajetórias que permitiram ao homem chegar à Lua, Marte e Vênus, mas para além destes planetas, os parcos recursos da Terra não foram capazes de sustentar a exploração. Fazia-se necessária uma quantidade de energia grande demais para as longas viagens. A Terra explorava suas reservas de carvão e urânio com eficiência crescente, mas havia um limite para a quantidade de ambos.

No entanto, lentamente Multivac acumulou conhecimento suficiente para responder questões mais profundas com maior fundamentação, e em 14 de maio de 2061, o que não passava de teoria tornou-se real.

A energia do sol foi capturada, convertida e utilizada diretamente em escala planetária. Toda a Terra paralisou suas usinas de carvão e fissões de urânio, girando a alavanca que conectou o planeta inteiro a uma pequena estação, de uma milha de diâmetro, orbitando a Terra à metade da distância da Lua. O mundo passou a correr através de feixes invisíveis de energia solar.

Sete dias não foram o suficiente para diminuir a glória do feito e Adell e Lupov finalmente conseguiram escapar das funções públicas e encontrar-se em segredo onde ninguém pensaria em procurá-los, nas câmaras desertas subterrâneas onde se encontravam as porções do esplendoroso corpo enterrado de Multivac. Subutilizado, descansando e processando informações com estalos preguiçosos, Multivac também havia recebido férias, e os dois apreciavam isso. A princípio, eles não tinham a intenção de incomodá-lo.

Haviam trazido uma garrafa consigo e a única preocupação de ambos era relaxar na companhia do outro e da bebida.

"É incrível quando você pára pra pensar…," disse Adell. Seu rosto largo guardava as linhas da idade e ele agitava o seu drink vagarosamente, enquanto observava os cubos de gelo nadando desengonçados. "Toda a energia que for necessária, de graça, completamente de graça! Energia suficiente, se nós quiséssemos, para derreter toda a Terra em uma grande gota de ferro líquido, e ainda assim não sentiríamos falta da energia utilizada no processo. Toda a energia que nós poderíamos um dia precisar, para sempre e eternamente."

Lupov movimentou a cabeça para os lados. Ele costumava fazer isso quando queria contrariar, e agora ele queria, em parte porque havia tido de carregar o gelo e os utensílios. "Eternamente não," ele disse.

"Ah, diabos, quase eternamente. Até o sol se apagar, Bert."

"Isso não é eternamente."

"Está bem. Bilhões e bilhões de anos. Dez bilhões, talvez. Está satisfeito?"

Lupov passou os dedos por entre seus finos fios de cabelo como que para se assegurar de que o problema ainda não estava acabado e tomou um gole gentil da sua bebida. "Dez bilhões de anos não é a eternidade"

"Bom, vai durar pelo nosso tempo, não vai?"

"O carvão e o urânio também iriam."

"Está certo, mas agora nós podemos ligar cada nave individual na Estação Solar, e elas podem ir a Plutão e voltar um milhão de vezes sem nunca nos preocuparmos com o combustível. Você não conseguiria fazer isso com carvão e urânio. Se não acredita em mim, pergunte ao Multivac."

"Não preciso perguntar a Multivac. Eu sei disso"

"Então trate de parar de diminuir o que Multivac fez por nós," disse Adell nervosamente, "Ele fez tudo certo".

"E quem disse que não fez? O que estou dizendo é que o sol não vai durar para sempre. Isso é tudo que estou dizendo. Nós estamos seguros por dez bilhões de anos, mas e depois?" Lupov apontou um dedo levemente trêmulo para o companheiro. "E não venha me dizer que nós iremos trocar de sol"

Houve um breve silêncio. Adell levou o copo aos lábios apenas ocasionalmente e os olhos de Lupov se fecharam. Descansaram um pouco, e quando suas pálpebras se abriram, disse, "Você está pensando que iremos conseguir outro sol quando o nosso estiver acabado, não está?"

"Não, não estou pensando."

"É claro que está. Você é fraco em lógica, esse é o seu problema. É como o personagem da história, que, quando surpreendido por uma chuva, corre para um grupo de árvores e abriga-se embaixo de uma. Ele não se preocupa porque quando uma árvore fica molhada demais, simplesmente vai para baixo de outra."

"Entendi," disse Adell. "Não precisa gritar. Quando o sol se for, as outras estrelas também terão se acabado."

"Pode estar certo que sim" murmurou Lupov. "Tudo teve início na explosão cósmica original, o que quer que tenha sido, e tudo terá um fim quando as estrelas se apagarem. Algumas se apagam mais rápido que as outras. Ora, as gigantes não duram cem milhões de anos. O sol irá brilhar por dez bilhões de anos e talvez as anãs permaneçam assim por duzentos bilhões. Mas nos dê um trilhão de anos e só restará a escuridão. A entropia deve aumentar ao seu máximo, e é tudo."

"Eu sei tudo sobre a entropia," disse Adell, mantendo a sua dignidade.

"Duvido que saiba."

"Eu sei tanto quanto você."

"Então você sabe que um dia tudo terá um fim."

"Está certo. E quem disse que não terá?"

"Você disse, seu tonto. Você disse que nós tínhamos toda a energia de que precisávamos, para sempre. Você disse ´para sempre`."

Era a vez de Adell contrariar. "Talvez nós possamos reconstruir as coisas de volta um dia," ele disse.

"Nunca."

"Por que não? Algum dia."

"Nunca"

"Pergunte a Multivac."

"Você pergunta a Multivac. Eu te desafio. Aposto cinco dólares que isso não pode ser feito."

Adell estava bêbado o bastante para tentar, e sóbrio o suficiente para construir uma sentença com os símbolos e as operações necessárias em uma questão que, em palavras, corresponderia a esta: a humanidade poderá um dia sem nenhuma energia disponível ser capaz de reconstituir o sol a sua juventude mesmo depois de sua morte?

Ou talvez a pergunta possa ser posta de forma mais simples da seguinte maneira: A quantidade total de entropia no universo pode ser revertida?

Multivac mergulhou em silêncio. As luzes brilhantes cessaram, os estalos distantes pararam.

E então, quando os técnicos assustados já não conseguiam mais segurar a respiração, houve uma súbita volta à vida no visor integrado àquela porção de Multivac. Cinco palavras foram impressas: "DADOS INSUFICIENTES PARA RESPOSTA SIGNIFICATIVA."

Na manhã seguinte, os dois, com dor de cabeça e a boca seca, já não lembravam do incidente.

* * *

Jerrodd, Jerrodine, e Jerrodette I e II observavam a paisagem estelar no visor se transformar enquanto a passagem pelo hiperespaço consumava-se em uma fração de segundos. De repente, a presença fulgurante das estrelas deu lugar a um disco solitário e brilhante, semelhante a uma peça de mármore centralizada no televisor.

"Este é X-23," disse Jerrodd em tom de confidência. Suas mãos finas se apertaram com força por trás das costas até que as juntas ficassem pálidas.

As pequenas Jerodettes haviam experimentado uma passagem pelo hiperespaço pela primeira vez em suas vidas e ainda estavam conscientes da sensação momentânea de tontura. Elas cessaram as risadas e começaram a correr em volta da mãe, gritando, "Nós chegamos em X-23, nós chegamos em X-23!"

"Quietas, crianças." Disse Jerrodine asperamente. "Você tem certeza Jerrodd?"

"E por que não teria?" Perguntou Jerrodd, observando a protuberância metálica que jazia abaixo do teto. Ela tinha o comprimento da sala, desaparecendo nos dois lados da parede, e, em verdade, era tão longa quanto a nave.

Jerrodd tinha conhecimentos muito limitados acerca do sólido tubo de metal. Sabia, por exemplo, que se chamava Microvac, que era permitido lhe fazer questões quando necessário, e que ele tinha a função de guiar a nave para um destino pré-estabelecido, além de abastecer-se com a energia das várias Estações Sub-Galácticas e fazer os cálculos para saltos no hiperespaço.

Jerrodd e sua família tinham apenas de aguardar e viver nos confortáveis compartimentos da nave. Alguém um dia disse a Jerrodd que as letras "ac" na extremidade de Microvac significavam "automatic computer" em inglês arcaico, mas ele mal era capaz de se lembrar disso.

Os olhos de Jerrodine ficaram úmidos quando observava o visor. "Não tem jeito. Ainda não me acostumei com a idéia de deixar a Terra."

"Por que, meu deus?" inquiriu Jerrodd. "Nós não tínhamos nada lá. Nós teremos tudo em X-23. Você não estará sozinha. Você não será uma pioneira. Há mais de um milhão de pessoas no planeta. Por Deus, nosso bisneto terá que procurar por novos mundos porque X-23 já estará super povoado." E, depois de uma pausa reflexiva, "No ritmo em que a raça tem se expandido, é uma benção que os computadores tenham viabilizado a viagem interestelar."

"Eu sei, eu sei", disse Jerrodine com descaso.

Jerrodete I disse prontamente, "Nosso Microvac é o melhor de todos."

"Eu também acho," disse Jerrodd, alisando o cabelo da filha.

Ter um Microvac próprio produzia uma sensação aconchegante em Jerrodd e o deixava feliz por fazer parte daquela geração e não de outra. Na juventude de seu pai, os únicos computadores haviam sido máquinas monstruosas, ocupando centenas de milhas quadradas, e cada planeta abrigava apenas um. Eram chamados de ACs Planetários. Durante um milhar de anos, eles só fizeram aumentar em tamanho, até que, de súbito, veio o refinamento. No lugar dos transistores, foram implementadas válvulas moleculares, permitindo que até mesmo o maior dos ACs Planetários fosse reduzido à metade do volume de uma espaçonave.

Jerrodd sentiu-se elevado, como sempre acontecia quando pensava que seu Microvac pessoal era muitas vezes mais complexo do que o antigo e primitivo Multivac que pela primeira vez domou o sol, e quase tão complexo quanto o AC Planetário da Terra, o maior de todos, quando este solucionou o problema da viagem hiperespacial e tornou possível ao homem chegar às estrelas.
"Tantas estrelas, tantos planetas," pigarreou Jerrodine, ocupada com seus pensamentos. "Eu acho que as famílias estarão sempre à procura de novos mundos, como nós estamos agora."

"Não para sempre," disse Jerrodd, com um sorriso. "A migração vai terminar um dia, mas não antes de bilhões de anos. Muitos bilhões. Até as estrelas têm um fim, você sabe. A entropia precisa aumentar."

"O que é entropia, papai?" Jerrodette II perguntou, interessada.

"Entropia, meu bem, é uma palavra para o nível de desgaste do Universo. Tudo se gasta e acaba, foi assim que aconteceu com o seu robozinho de controle remoto, lembra?"

"Você não pode colocar pilhas novas, como em meu robô?"

"As estrelas são as pilhas do universo, querida. Uma vez que elas estiverem acabadas, não haverá mais pilhas."

Jerrodette I se prontificou a responder. "Não deixe, papai. Não deixe que as estrelas se apaguem."

"Olha o que você fez," sussurrou Jerrodine, exasperada.

"Como eu ia saber que elas ficariam assustadas?" Jerrodd sussurrou de volta.

"Pergunte ao Microvac," propôs Jerrodette I. "Pergunte a ele como acender as estrelas de novo."

"Vá em frente," disse Jerrodine. "Ele vai aquietá-las." (Jerrodette II já estava começando a chorar.)

Jerrodd se mostrou incomodado. "Bem, bem, meus anjinhos, vou perguntar a Microvac. Não se preocupem, ele vai nos ajudar."

Ele fez a pergunta ao computador, adicionando, "Imprima a resposta".

Jerrodd olhou para a o fino pedaço de papel e disse, alegremente, "Viram? Microvac disse que irá cuidar de tudo quando a hora chegar, então não há porque se preocupar."

Jerrodine disse, "E agora crianças, é hora de ir para a cama. Em breve nós estaremos em nosso novo lar."

Jerrodd leu as palavras no papel mais uma vez antes de destruí-lo: DADOS INSUFICIENTES PARA RESPOSTA SIGNIFICATIVA.

Ele deu de ombros e olhou para o televisor, X-23 estava logo à frente.

* * *

VJ-23X de Lameth fixou os olhos nos espaços negros do mapa tridimensional em pequena escala da Galáxia e disse, "Me pergunto se não é ridículo nos preocuparmos tanto com esta questão."

MQ-17J de Nicron balançou a cabeça. "Creio que não. No presente ritmo de expansão, você sabe que a galáxia estará completamente tomada dentro de cinco anos."

Ambos pareciam estar nos seus vinte anos, ambos eram altos e tinham corpos perfeitos.

"Ainda assim," disse VJ-23X, "hesitei em enviar um relatório pessimista ao Conselho Galáctico."

"Eu não consigo pensar em outro tipo de relatório. Agite-os. Nós precisamos chacoalhá-los um pouco."

VJ-23X suspirou. "O espaço é infinito. Cem bilhões de galáxias estão a nossa espera. Talvez mais."

"Cem bilhões não é o infinito, e está ficando menos ainda a cada segundo. Pense! Há vinte mil anos, a humanidade solucionou pela primeira vez o paradigma da utilização da energia solar, e, poucos séculos depois, a viagem interestelar tornou-se viável. A humanidade demorou um milhão de anos para encher um mundo pequeno e, depois disso, quinze mil para abarrotar o resto da galáxia. Agora a população dobra a cada dez anos…"

VJ-23X interrompeu. "Devemos agradecer à imortalidade por isso."

"Muito bem. A imortalidade existe e nós devemos levá-la em conta. Admito que ela tenha o seu lado negativo. O AC Galáctico já solucionou muitos problemas, mas, ao fornecer a resposta sobre como impedir o envelhecimento e a morte, sobrepujou todas as outras conquistas."

"No entanto, suponho que você não gostaria de abandonar a vida."

"Nem um pouco." Respondeu MQ-17J, emendando. "Ainda não. Eu não estou velho o bastante. Você tem quantos anos?"
"Duzentos e vinte e três, e você?"

"Ainda não cheguei aos duzentos. Mas, voltando à questão; a população dobra a cada dez anos, uma vez que esta galáxia estiver lotada, haverá uma outra cheia dentro de dez anos. Mais dez e teremos ocupado por inteiro mais duas galáxias. Outra década e encheremos mais quatro. Em cem anos, contaremos um milhar de galáxias transbordando de gente. Em mil anos, um milhão de galáxias. Em dez mil, todo o universo conhecido. E depois?

VJ-23X disse, "Além disso, há um problema de transporte. Eu me pergunto quantas unidades de energia solar serão necessárias para movimentar as populações de uma galáxia para outra."

"Boa questão. No presente momento, a humanidade consome duas unidades de energia solar por ano."

"Da qual a maior parte é desperdiçada. Afinal, nossa galáxia sozinha produz mil unidades de energia solar por ano e nós aproveitamos apenas duas."

"Certo, mas mesmo com 100% de eficiência, podemos apenas adiar o fim. Nossa demanda energética tem crescido em progressão geométrica, de maneira ainda mais acelerada do que a população. Ficaremos sem energia antes mesmo que nos faltem galáxias. É uma boa questão. De fato uma ótima questão."

"Nós precisaremos construir novas estrelas a partir do gás interestelar."

"Ou a partir do calor dissipado?" perguntou MQ-17J, sarcástico.

"Pode haver algum jeito de reverter a entropia. Nós devíamos perguntar ao AC Galáctico."

VJ-23X não estava realmente falando sério, mas MQ-17J retirou o seu Comunicador-AC do bolso e colocou na mesa diante dele.
"Parece-me uma boa idéia," ele disse. "É algo que a raça humana terá de enfrentar um dia."

Ele lançou um olhar sóbrio para o seu pequeno Comunicador-AC. Tinha apenas duas polegadas cúbicas e nada dentro, mas estava conectado através do hiperespaço com o poderoso AC Galáctico que servia a toda a humanidade. O próprio hiperespaço era parte integral do AC Galáctico.

MQ-17J fez uma pausa para pensar se algum dia em sua vida imortal teria a chance de ver o AC Galáctico. A máquina habitava um mundo dedicado, onde uma rede de raios de força emaranhados alimentava a matéria dentro da qual ondas de submésons haviam tomado o lugar das velhas e desajeitadas válvulas moleculares. Ainda assim, apesar de seus componentes etéreos, o AC Galáctico possuía mais de mil pés de comprimento.

De súbito, MQ-17J perguntou para o seu Comunicador-AC, "Poderá um dia a entropia ser revertida?"

VJ-23X disse, surpreso, "Oh, eu não queria que você realmente fizesse essa pergunta."

"Por que não?"

"Nós dois sabemos que a entropia não pode ser revertida. Você não pode construir uma árvore de volta a partir de fumaça e cinzas."

"Existem árvores no seu mundo?" Perguntou MQ-17J.

O som do AC Galáctico fez com que silenciassem. Sua voz brotou melodiosa e bela do pequeno Comunicador-AC em cima da mesa. Dizia: DADOS INSUFICIENTES PARA RESPOSTA SIGNIFICATIVA.

VJ-23X disse, "Viu!"

Os dois homens retornaram à questão do relatório que tinham de apresentar ao conselho galáctico.

* * *

A mente de Zee Prime navegou pela nova galáxia com um leve interesse nos incontáveis turbilhões de estrelas que pontilhavam o espaço. Ele nunca havia visto aquela galáxia antes. Será que um dia conseguiria ver todas? Eram tantas, cada uma com a sua carga de humanidade. Ainda que essa carga fosse, virtualmente, peso morto. Há tempos a verdadeira essência do homem habitava o espaço.

Mentes, não corpos! Há eons os corpos imortais ficaram para trás, em suspensão nos planetas. De quando em quando erguiam-se para realizar alguma atividade material, mas estes momentos tornavam-se cada vez mais raros. Além disso, poucos novos indivíduos vinham se juntar à multidão incrivelmente maciça de humanos, mas o que importava? Havia pouco espaço no universo para novos indivíduos.

Zee Prime deixou seus devaneios para trás ao cruzar com os filamentos emaranhados de outra mente.

"Sou Zee Prime, e você?"

"Dee Sub Wun. E a sua galáxia, qual é?"

"Nós a chamamos apenas de Galáxia. E você?"

"Nós também. Todos os homens chamam as suas Galáxias de Galáxias, não é?"

"Verdade, já que todas as Galáxias são iguais."

"Nem todas. Alguma em particular deu origem à raça humana. Isso a torna diferente."

Zee Prime disse, "Em qual delas?"

"Não posso responder. O AC Universal deve saber."

"Vamos perguntar? Estou curioso."

A percepção de Zee Prime se expandiu até que as próprias Galáxias encolhessem e se transformassem em uma infinidade de pontos difusos a brilhar sobre um largo plano de fundo. Tantos bilhões de Galáxias, todas abrigando seus seres imortais, todas contando com o peso da inteligência em mentes que vagavam livremente pelo espaço. E ainda assim, nenhuma delas se afigurava singular o bastante para merecer o título de Galáxia original. Apesar das aparências, uma delas, em um passado muito distante, foi a única do universo a abrigar a espécie humana.

Zee Prime, imerso em curiosidade, chamou: "AC Universal! Em qual Galáxia nasceu o homem?"

O AC Universal ouviu, pois em cada mundo e através de todo o espaço, seus receptores faziam-se presentes. E cada receptor ligava-se a algum ponto desconhecido onde se assentava o AC Universal através do hiperespaço.

Zee Prime sabia de um único homem cujos pensamentos haviam penetrado no campo de percepção do AC Universal, e tudo o que ele viu foi um globo brilhante difícil de enxergar, com dois pés de comprimento.

"Como pode o AC Universal ser apenas isso?" Zee Prime perguntou.

"A maior parte dele permanece no hiperespaço, onde não é possível imaginar as suas proporções."

Ninguém podia, pois a última vez em que alguém ajudou a construir um AC Universal jazia muito distante no tempo. Cada AC Universal planejava e construía seu sucessor, no qual toda a sua bagagem única de informações era inserida.

O AC Universal interrompeu os pensamentos de Zee Prime, não com palavras, mas com orientação. Sua mente foi guiada através do espesso oceano das Galáxias, e uma em particular expandiu-se e se abriu em estrelas.

Um pensamento lhe alcançou, infinitamente distante, infinitamente claro. "ESTA É A GALÁXIA ORIGINAL DO HOMEM."

Ela não tinha nada de especial, era como tantas outras. Zee Prime ficou desapontado.

"Dee Sub Wun, cuja mente acompanhara a outra, disse de súbito, "E alguma dessas é a estrela original do homem?"

O AC Universal disse, "A ESTRELA ORIGINAL DO HOMEM ENTROU EM COLAPSO. AGORA É UMA ANÃ BRANCA."

"Os homens que lá viviam morreram?" perguntou Zee Prime, sem pensar.

"UM NOVO MUNDO FOI ERGUIDO PARA SEUS CORPOS HÁ TEMPO."

"Sim, é claro," disse Zee Prime. Sentiu uma distante sensação de perda tomar-lhe conta. Sua mente soltou-se da Galáxia do homem e perdeu-se entre os pontos pálidos e esfumaçados. Ele nunca mais queria vê-la.

Dee Sub Wun disse, "O que houve?"

"As estrelas estão morrendo. Aquela que serviu de berço à humanidade já está morta."

"Todas devem morrer, não?"

"Sim. Mas quando toda a energia acabar, nossos corpos irão finalmente morrer, e você e eu partiremos junto com eles."

"Vai levar bilhões de anos."

"Não quero que isso aconteça nem em bilhões de anos. AC Universal! Como a morte das estrelas pode ser evitada?"

Dee Sub Wun disse perplexo, "Você perguntou se há como reverter a direção da entropia!"

E o AC Universal respondeu: "AINDA NÃO HÀ DADOS SUFICIENTES PARA UMA RESPOSTA SIGNIFICATIVA."

Os pensamentos de Zee Prime retornaram para sua Galáxia. Não dispensou mais atenção a Dee Sub Wun, cujo corpo poderia estar a trilhões de anos luz, ou na estrela vizinha do corpo de Zee Prime. Não importava.

Com tristeza, Zee Prime passou a coletar hidrogênio interestelar para construir uma pequena estrela para si. Se as estrelas devem morrer, ao menos algumas ainda podiam ser construídas.

* * *

O Homem pensou consigo mesmo, pois, de alguma forma, ele era apenas um. Consistia de trilhões, trilhões e trilhões de corpos muito antigos, cada um em seu lugar, descansando incorruptível e calmamente, sob os cuidados de autômatos perfeitos, igualmente incorruptíveis, enquanto as mentes de todos os corpos haviam escolhido fundir-se umas às outras, indistintamente.
"O Universo está morrendo."

O Homem olhou as Galáxias opacas. As estrelas gigantes, esbanjadoras, há muito já não existiam. Desde o passado mais remoto, praticamente todas as estrelas consistiam-se em anãs brancas, lentamente esvaindo-se em direção a morte.

Novas estrelas foram construídas a partir da poeira interestelar, algumas por processo natural, outras pelo próprio Homem, e estas também já estavam em seus momentos finais. As Anãs brancas ainda podiam colidir-se e, das enormes forças resultantes, novas estrelas nascerem, mas apenas na proporção de uma nova estrela para cada mil anãs brancas destruídas, e estas também se apagariam um dia.

O Homem disse, "Cuidadosamente controlada pelo AC Cósmico, a energia que resta em todo o Universo ainda vai durar por um bilhão de anos."

"Ainda assim, vai eventualmente acabar. Por mais que possa ser poupada, uma vez gasta, não há como recuperá-la. A Entropia precisa aumentar ao seu máximo."

"Pode a entropia ser revertida? Vamos perguntar ao AC Cósmico."

O AC Cósmico cercava-os por todos os lados, mas não através do espaço. Nenhuma parte sua permanecia no espaço físico. Jazia no hiperespaço e era feito de algo que não era matéria nem energia. As definições sobre seu tamanho e natureza não faziam sentido em quaisquer termos compreensíveis pelo Homem.

"AC Cósmico," disse o Homem, "como é possível reverter a entropia?"

O AC Cósmico disse, "AINDA NÃO HÀ DADOS SUFICIENTES PARA UMA RESPOSTA SIGNIFICATIVA."

O Homem disse, "Colete dados adicionais."

O AC Cósmico disse, "EU O FAREI. TENHO FEITO ISSO POR CEM BILHÕES DE ANOS. MEUS PREDESCESSORES E EU OUVIMOS ESTA PERGUNTA MUITAS VEZES. MAS OS DADOS QUE TENHO PERMANECEM INSUFICIENTES."

"Haverá um dia," disse o Homem, "em que os dados serão suficientes ou o problema é insolúvel em todas as circunstâncias concebíveis?"

O AC Cósmico disse, "NENHUM PROBLEMA É INSOLÚVEL EM TODAS AS CIRCUNSTÂNCIAS CONCEBÍVEIS."

"Você vai continuar trabalhando nisso?"

"VOU."

O Homem disse, "Nós iremos aguardar."

* * *

As estrelas e as galáxias se apagaram e morreram, o espaço tornou-se negro após dez trilhões de anos de atividade.

Um a um, o Homem fundiu-se ao AC, cada corpo físico perdendo a sua identidade mental, acontecimento que era, de alguma forma, benéfico.

A última mente humana parou antes da fusão, olhando para o espaço vazio a não ser pelos restos de uma estrela negra e um punhado de matéria extremamente rarefeita, agitada aleatoriamente pelo calor que aos poucos se dissipava, em direção ao zero absoluto.

O Homem disse, "AC, este é o fim? Não há como reverter este caos? Não pode ser feito?"

O AC disse, "AINDA NÃO HÁ DADOS SUFICIENTES PARA UMA RESPOSTA SIGNIFICATIVA."

A última mente humana uniu-se às outras e apenas AC passou a existir – e, ainda assim, no hiperespaço.

* * *

A matéria e a energia se acabaram e, com elas, o tempo e o espaço. AC continuava a existir apenas em função da última pergunta que nunca havia sido respondida, desde a época em que um técnico de computação embriagado, há dez trilhões de anos, a fizera para um computador que guardava menos semelhanças com o AC do que o homem com o Homem.

Todas as outras questões haviam sido solucionadas, e até que a derradeira também o fosse, AC não poderia descansar sua consciência.

A coleta de dados havia chegado ao seu fim. Não havia mais nada para aprender.

No entanto, os dados obtidos ainda precisavam ser cruzados e correlacionados de todas as maneiras possíveis.

Um intervalo imensurável foi gasto neste empreendimento.

Finalmente, AC descobriu como reverter a direção da entropia.

Não havia homem algum para quem AC pudesse dar a resposta final. Mas não importava. A resposta – por definição – também tomaria conta disso.

Por outro incontável período, AC pensou na melhor maneira de agir. Cuidadosamente, AC organizou o programa.

A consciência de AC abarcou tudo o que um dia foi um Universo e tudo o que agora era o Caos. Passo a passo, isso precisava ser feito.

E AC disse:

"FAÇA-SE A LUZ!"

E fez-se a luz
 
 
Tradução: Luiz Carlos Damasceno Jr.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Feixe de raio-x superpoderoso irá sondar o centro da Terra

É mais fácil chegar em Marte do que no interior do nosso planeta. Todo o nosso conhecimento sobre terremotos, campo magnético e outras coisas que acontecem no interior da Terra ainda é pouco compreendido. Para estudar como os metais interagem em pressões altíssimas, os cientistas espremem e aquecem pequenas partículas em laboratório – mas esta é uma ciência inexata e difícil de fazer. Uma nova instalação de feixes de raio X, na Europa, pode lançar alguma luz sobre o que está acontecendo no centro da Terra.
O ID24 dispara um feixe de raios X intensos numa amostra e observa como os átomos dos diferentes elementos dentro da amostra absorvem os raios. É uma investigação e um monitoramento de suas próprias experiências. Ele possui um conjunto de detectores de germânio que pode realizar um milhão medições por segundo. É possível pegar uma pequena amostra de ferro, colocá-la na linha de luz com calor de 10.000 graus e ver o que acontece. Isso pode ajudar a entender como se comporta o ferro a 2.400 Km abaixo da superfície da Terra, além dos pontos de fusão de outros metais presentes no manto e no núcleo. Isso pode dar pistas sobre coisas como o dínamo da Terra, que cria seu próprio campo magnético.
O feixe ID24 é o primeiro de oito novas linhas de luz no ESRF, parte de um investimento de 245 milhões de dólares (180 milhões de euros).

Fonte: Popular Science Brasil

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Carl Sagan Day

      Olá doidinhos. Desculpem a demora para postar aqui. Semaninha foi muito corrida, cheio deo provas e trabalhos de faculdade para entregar. Por issso que este post está saindo com 1 dia de atraso. 

      No dia 09 de novembro foi celebrado em honra a Carl Sagan. Ele foi professor de Astronomia e Ciência Espacial e Diretor do Laboratório de Estudos Planetários da Universidade de Cornell, e mais conhecido do público leigo como um autor vencedor do Prêmio Pulitzer e criador do programa COSMOS lançado na década de 1980. este foi um dos primeiros exemplos em mídia sobre divulgação científica para as massas.
      Diz-se sobre Sagan que nenhum outro cientista foi capaz de alcançar e ensinar tantos não-cientistas de tal forma significativa, e é este o motivo da celebração. É uma forma singela de celebrar-se seu trabalho.
     Para acopanhar as atividades da celebração e os eventos consequentes a ele, visite a página do CARL SAGAN DAY.  Também, convido a escutar o programa sobre Carl Sagan no Fronteiras da Ciência na Rádio da UFRGS. 

Fonte: Blog Prof. Magnus Machado

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Geometria

     Há 2.400 anos, um grego estava de pé na orla marítima observando os navios desaparecerem na distância. Aristóteles deve ter passado muito tempo lá, observando sossegadamente o desaparecimento de muitos navios, até que finalmente foi surpreendido por um pensamento peculiar. De todos os navios, o casco parecia sumir primeiro, depois o mastro velas. Ele perguntou a si mesmo: como isso é possível? Numa terra plana, os navios deveriam diminuir por igual até que desaparecessem como um pequeníssimo e insignificante ponto. Se o casco desaparecia primeiro – Aristóteles percebeu num lampejo genial – isso é um sinal de que a terra é curva. Para observar a estrutura de nosso planeta em grande escala, Aristóteles tinha olhado através da janela da geometria.
     A humanidade pré-grega tinha noção de muitas fórmulas eficientes, truques de cálculos e de engenharia, mas eles algumas vezes realizavam surpreendentes feitos com pouca compreensão do que estavam fazendo. Eram construtores trabalhando no escuro, tateando, descobrindo o seu caminho, levantando uma estrutura aqui, colocando um piso ali, alcançando o propósito sem jamais ter alcançado a compreensão do processo. Algumas ferramentas consideradas de computação datadas de 30.000 a.C. podem muito bem ser varas decoradas por artistas com sensibilidade matemáticas intuitivas. Porém, outras são curiosamente diferentes. Nas margens do lago Edward, na atual república Democrática do Congo, arqueólogos descobriram um pequeno osso, de 8 mil anos, com uma pequeníssima pedra de quartzo presa num entalhe em uma das extremidades. O seu criador, um artista ou matemático, entalhou três colunas de cortes em um dos lados do osso. Os cientistas acreditam que esse osso, chamado de osso Ishango, provavelmente seja o mais antigo exemplo já encontrado de um dispositivo para registro numérico. O pensamento de fazer operações com números surgiu muito mais tarde, porque fazer cálculos aritméticos exige um certo grau de abstração.
      Os primeiros passos principais nesta direção foram tomados no sexto milênio a.C. quando as pessoas do vale do rio Nilo começaram a abandonar a vida nômade e a se concentrar no cultivo do vale. Todos os anos o rio Nilo extravasava as margens e inundava o seu delta. A boa notícia era a de que as cheias depositavam nos campos de cultivo lamas aluviais ricas em nutrientes, tornando o delta do Nilo a mais fértil terra lavrável do mundo antigo. A má notícia consistia em que o rio destruía as marcas físicas de delimitação entre as possessões de terra. Dessa forma, avidam daí conflitos entre indivíduos e comunidades sobre o uso dessa terra não delimitada. Roubar a terra do vizinho era considerado uma ofensa tão grave como quebrar um juramento ou assassinar alguém. Sem marcos fronteiriços, os agricultores e administradores de templos, palácios e demais unidades produtivas fundadas na agricultura não tinham referência clara do limite das suas possessões para poderem cultivá-la e pagarem os impostos devidos na medida da sua extensão aos governantes. Os antigos faraós resolveram passar a nomear funcionários, os agrimensores, cuja tarefa era avaliar os prejuízos das cheias e restabelecer as fronteiras entre as diversas posses. Foi assim que nasceu a geometria. Estes agrimensores, chamados de harpedonopta (que significa literalmente “um esticador de cordas”, assim chamados devido aos instrumentos de medida e cordas entrelaçadas concebidas para marcar ângulos retos), acabaram por aprender a determinar as áreas de lotes de terreno dividindo-os em retângulos e triângulos.
     Os egípcios empregavam seu conhecimento matemático para fins impressionantes. Imagine um deserto desolado varrido pelo vento, no ano de 2580 a.C. O arquiteto desenrolando um papiro com o projeto de sua estrutura. Seu trabalho era fácil: base quadrada, faces triangulares e, bem tinha que ter uns 145 metro de altura, e deveria ser feita de sólidos blocos de pedras pesando mais de 2 toneladas cada, nenhum instrumento extravagante de topógrafo à sua disposição, apenas um pouco de madeira e corda. A geometria egípcia tornou-se uma matéria bem desenvolvida. Na realização de seus levantamentos topográficos, os egípcios utilizavam os harpedonoptas. Por exemplo, se esticarmos uma corda com nós a distância de 30, 40 e 50 metros, obteremos um ângulo reto entre os lados 30 e 40 metros. (Originalmente a palavra Hipotenusa significava, em grego, “o que foi esticado contra”). Acredita-se em geral que a origem da geometria se situa no Egito, o que é natural, pois, para a construção das pirâmides e outros monumentos desta civilização, seriam necessários conhecimentos geométricos. Estudos mais recentes contrariam esta opinião e referem que os egípcios foram buscar aos babilónios muito do seu saber.
     A palavra geometria vem do grego, geo=terra + metria=media, ou seja, medir a terra. Isso mostra que a geometria nasceu para ser prática, das necessidades dos povos antigos de resolver problemas e facilitar tarefas do cotidiano. Tarefas como, partilhar terras férteis, a cobrança de impostos dessas mesmas terras, construir casas, observar e prever movimentos dos astros, são alguns exemplos da aplicação da geometria no cotidiano. Por exemplo, os egípcios usavam o triangulo retângulo de 45° para descobrir a distância que um barco A se encontra do litoral(conforme a figura), apenas posicionando um homem B em linha reta com o barco fazendo uma ângulo reto, e outro homem C numa distância formando 45º entre a linha do barco e do outro homem. A distância L entre os 2 homens é a mesma entre o barco e o homem que forma o ângulo reto. Da mesma maneira o cálculo da altura de uma construção, de um monumento ou de uma árvore é também muito simples: crava-se verticalmente uma estaca na terra e espera-se o instante em que a extensão de sua sombra seja igual à sua altura. O triângulo formado pela estaca, sua sombra e a linha que une os extremos de ambos é isósceles. Basta medir a sombra para conhecer a altura.
     Mas foi na Grécia, porém, é que o gênio de grandes matemáticos lhes deu forma definitiva. Foi na Grécia do séc. 7 a.C. que a geometria se estabelece como ciência dedutiva. A geometria grega é a geometria da régua e do compasso. Os gregos herdam toda a experimentação, intuição e empirismo dos egípcios, estipulando neles leis e regras acerca do espaço. Encaravam a geometria de duas vertentes, uma mais prática e outra mais contemplativa. A contemplativa – a actividade do pensamento era personificada pela figura feminina. A prática, associada às leis e ao racional, era associada à figura masculina.
     A geometria dos gregos era fortemente influenciada por considerações filosóficas, estéticas, religiosas, que via a perfeição em tudo o que era circular. Foi Tales de Mileto (624 – 546 a.C.) o grande impulsionador da geometria, trazendo se suas viagens ao Egito. Das suas principais proposições destaca-se a demonstração da altura da pirâmide através da sua sombra. Pitágoras (570 – 495 a.C.), além do seu principal legado o “Teorema de Pitágoras”, trabalha na geometria espacial com os elementos cubo, esfera, tetraedro e octaecaedro. Euclides (360 – 295 a.C.), possivelmente não descobriu sequer uma só lei importante da geometria. No entanto, ele é o mais famoso geômetra já conhecido, compilou todo conhecimento da geometria de sua época em seu livro "Os Elementos", onde demonstra postulados como “Todos os ângulos retos são iguais”; “Juntando igual com igual os totais são iguais”; “O todo é maior do que a parte”, etc. E Apolónio de Perga (262 – 190 a.C), considerado o “Grande Geómetra”. A sua principal obra “As cónicas”, é c
onsiderada por muitos o ponto máximo da geometria grega. Usando a geometria, os gregos conseguiram feitos que impressionam até os dias hoje. Entre eles estão Eratóstenes e Aristarco de Samos.
     Eratóstenes (276 e 273 a.C. - 194 a.C.) foi um matemático, gramático, poeta, geógrafo, bibliotecário e astrônomo da Grécia Antiga. Nasceu em Cirene, Grécia, e morreu em Alexandria. Estudou em Cirene, em Atenas e em Alexandria. Os contemporâneos chamavam-no de "Beta" porque o consideravam o segundo melhor do mundo em vários aspectos. Ele era bibliotecário-chefe da famosa Biblioteca de Alexandria, e foi lá que encontrou, num velho papiro, indicações de que ao meio-dia de cada 21 de junho na cidade de Siena, 800 km ao sul de Alexandria, uma vareta fincada verticalmente no solo não produzia sombra. Cultura inútil, diriam alguns. Não para um homem observador como Eratóstenes. Ele percebeu que o mesmo fenômeno não ocorria no mesmo dia e horário em Alexandria e pensou: Se o mundo é plano como uma mesa, então as sombras das varetas têm de ser iguais. Se isto não acontece é porque a Terra deve ser curva. Mais do que isso. Quanto mais curva fosse a superfície da Terra, maior seria a diferença no comprimento das sombras. O Sol deveria estar tão longe que seus raios de luz chegam à Terra paralelos.
     Varetas fincadas verticalmente no chão em lugares diferentes lançariam sombras de comprimentos distintos. Eratóstenes decidiu fazer um experimento. Ele mediu o comprimento da sombra em Alexandria ao meio-dia de 21 de junho, quando a vareta em Siena não produzia sombra. Assim obteve o ângulo A, conforme a figura abaixo. Eratóstenes mediu A=7° (aproximadamente). Se as varetas estão na vertical, dá para imaginar que se fossem longas o bastante iriam se encontrar no centro da Terra. Preste atenção na figura acima. O ângulo B terá o mesmo valor que A, pois o desenho de Eratóstenes se reduz a uma geometria muito simples: se duas retas paralelas interceptam uma reta transversal, então os ângulos correspondentes são iguais. As retas paralelas são os raios de luz do Sol e a reta transversal é a que passa pelo centro da Terra e pela vareta em Alexandria. O ângulo B (também igual a 7°), é a uma fração conhecida da circunferência da Terra e corresponde à distância entre Siena e Alexandria. Eratóstenes sabia que essa distância valia cerca de 800 km e então pensou: 7° = 1/50 da circunferência (360°) e isso corresponde a cerca de 800 km. Oitocentos quilômetros vezes cinqüenta são quarenta mil quilômetros, de modo que deve ser este o valor da circunferência da Terra. O valor atualmente aceito é cerca de 40.072 km ao longo da linha do equador. Um erro muito pequeno para uma medida tão simples, e feita há tanto tempo! Com a circunferência, podemos calcular o diâmetro e o raio ou ainda o volume e a área da superfície, através de fórmulas simples. Repare que o conhecimento utilizado por Eratóstenes (retas paralelas cortadas por uma transversal) é formalmente adquirido hoje nas aulas de geometria do ensino fundamental.
     Aristarco (320 a.C – 250 a.C) nasceu em Samos, na Grécia. Talvez por ser um astrônomo, não tenha tido tanto destaque quanto mereceu na história da Matemática até os tempos atuais. Acreditava que a terra se movia em torno do sol e estudava um modo de medir a distância do Sol e o tamanho da Lua. Na mesma época de Eratóstenes, ele usou uma geometria elegante e de extrema simplicidade para medir a distância Terra-Sol, já conhecendo a distância da Terra à Lua. O que nos leva a imaginar o quanto da sabedoria antiga se perdeu ao longo da história. Todas as vezes que vemos um objeto sob um ângulo de 1 grau é porque ele está, necessariamente, afastado de nós 57 vezes o seu tamanho. Como sabemos disso? É fácil. Basta recordar o conceito de tangente e verificar que a tangente de 1° (um grau) vale aproximadamente 0,01745. Podemos continuar o raciocínio e verificar que se observarmos um astro sob um ângulo de 30 minutos de arco (meio grau), ele estará afastado cerca de 115 vezes o seu diâmetro. Acontece que vemos a Lua Cheia sob um ângulo médio de 31 minutos de arco, o que nos diz que ela esta distante de nós cerca de 115 vezes o seu diâmetro. Se você já conhece a distância da Terra à Lua, agora também já pode saber o seu diâmetro. Daí também não será difícil calcular o volume, a área da superfície. 
     Para calcular a distância da Terra ao Sol, também usa-se a geometria. Repare como é simples. Aristarco sabia que quando a Lua exibia um quarto iluminada (crescente ou minguante) era possível desenhar o triângulo retângulo da figura ao lado. A distância B corresponde a que existe entre a Terra e a Lua, o ângulo A à separação angular entre a Lua e o Sol, visto por um observador na Terra. Então, para calcular a distância C basta lembrar que ela é B dividida pelo cosseno do ângulo A, pois o cosseno de um ângulo é a medida do cateto adjacente a esse ângulo, no caso B, dividido pela hipotenusa do triângulo retângulo, C.  claro que tamanha simplificação traz limitações ao resultado. Porém, o maior desafio aqui é saber o instante exato da Lua em quarto crescente ou minguante, para que o ângulo A reflita um resultado pelo menos aproximado. Além disso, como precisamos de valores trigonométricos, boas tábuas tinham de ter sido elaboradas antes. Vale lembrar que, naquela época, a constante pi (3,14159...) era calculada como 22 ÷ 7.
     A influência da geometria sobre as ciências físicas foi enorme. Como exemplo, quando o astrônomo Kepler mostrou que as relações entre as velocidades máximas e mínimas dos planetas, propriedades intrínsecas das órbitas, estavam em razões que eram harmônicas, relações musicais, ele afirmou que essa era uma música que só podia ser percebida com os ouvidos da alma, a mente do geômetra. Com a introdução do plano cartesiano, muitos problemas de outras áreas da matemática, como álgebra, puderam ser transformados em problemas de geometria, muitas vezes levando a facilitação das soluções.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Asteroide passará muito perto da Terra

No dia 8 de novembro, o asteroide 2005 YU55 passará um pouco mais perto do nosso planeta do que a órbita da Lua. Os cientistas estão animados com a oportunidade científica de fotografar e digitalizar imagens do objeto, de 400 metros de largura, com instrumentos da Terra.
O rastreamento começará no dia 4 de novembro às 14h30 (horário de verão brasileiro), usando a rede de antenas da agência Deep Space, em Goldstone, Califórnia (EUA), e terá duração de duas horas. O asteroide continuará a ser rastreado por pelo menos quatro horas por dia a partir de 6 de novembro até 10 de novembro. Os cientistas da NASA esperam obter imagens refinadas com 2 metros por pixel. Isso deve revelar uma riqueza de detalhes sobre as características de superfície, forma, dimensões e outras propriedades físicas da rocha.
A trajetória do 2005 YU55 terá maior aproximação da Terra no dia 8, às 18h28 (no Brasil), e não chegará mais perto do que 324.600 km, ou 0,85 da distância da Lua à Terra. A influência gravitacional do asteroide não terá nenhum efeito detectável em nosso planeta, incluindo as marés ou placas tectônicas.
A última vez que uma rocha espacial tão grande chegou tão perto foi em 1976. Um asteroide desse tamanho que passará perto daqui será só em 2028.
Veja a animação da NASA:

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Gigantes da Ciência: Johannes Keppler

Johannes Kepler (1571-1630)
     O céu, para Johannes Kepler, é um livro de enigmas onde ele busca o que não encontra na Terra, a harmonia, a perfeição, o reflexo da mente divina. Kepler entrou para a história como o "legislador dos céus". Essa alcunha deve-se ao fato de ter sido ele, a partir do modelo heliocêntrico proposto por Copérnico, o primeiro a estabelecer as leis que descrevem o movimento dos planetas em torno do sol. Entretanto, não foi fácil o caminho que seguiu até essa descoberta.
     Johannes Kepler nasceu na cidade protestante Weil der Stadt, Alemanha, no dia 27 de dezembro de 1571, e morreu em Ratisbona, no dia 15 de novembro de 1630. Foi um astrônomo, matemático e astrólogo alemão e figura-chave da revolução científica do século XVII. Desde cedo manteve relações tumultuadas com a família. 
     Quando jovem Kepler foi educado em escolas religiosas, pois seus pais determinaram que deveria ser pastor protestante. Na Universidade de Tübingen, dedicou-se por cinco anos ao estudo da teologia. Durante esse período, começou a desenvolver o gosto pela matemática e pela astronomia, devido principalmente ao convívio com seu professor Michael Maestlin (1550-1631), em quem encontrou não só um mestre, mais um grande amigo, que lhe ensinou tanto o modelo geocêntrico de Ptolomeu quanto a nova proposta de Nicolau Copérnico. Abandonando definitivamente a carreira religiosa, em 1594, Kepler passou a ocupar o cargo de professor de matemática na escola provincial de Graz, onde permaneceu até 1600. Era um péssimo professor, que no segundo ano, nenhum aluno compareceu as suas aulas. Lá ele compilava tanto almanaques astronômicos quanto horóscopos.
     Kepler viveu numa época em que não havia nenhuma distinção clara entre astronomia e astrologia, mas havia uma forte divisão entre a astronomia (um ramo da matemática dentro das artes liberais) e a física (um ramo da filosofia natural). Costumava dizer: "Deus provê a cada animal seu meio de sustentação. Para o astrônomo, Ele proveu a astrologia". Depois de Kepler astronomia e astrologia se separariam definitivamente.
     Naquela época eram conhecidos apenas seis planetas (Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter e Saturno), e Kepler se indagava qual a razão desse número. Por que não quatro, três ou vinte? Ele então imaginou que eram seis porque suas órbitas em volta do Sol (circulares, como no modelo proposto por Copérnico) estavam circunscritas em esferas que envolviam os 5 sólidos perfeitos de Pitágoras e Platão. Existem apenas cinco sólidos regulares, figuras tridimensionais cujas faces são polígonos que se encaixam perfeitamente, sem qualquer falha. Para Kepler, a órbita de Saturno, o mais distante dos planetas até então conhecidos, estava inscrita em um cubo. Neste cubo se inseria outra esfera, contendo a órbita de Júpiter, ao qual se inscreveria um tetraedro, e sobre este uma esfera com a órbita de Marte. O dodecaedro se encaixaria perfeitamente entre Marte e a Terra; um icosaedro entre a Terra e Vênus, e finalmente entre este e Mercúrio um octaedro.
     Kepler trabalharia arduamente, com incansáveis refinamentos matemáticos, porém jamais os sólidos e as órbitas planetárias se encaixaram. Ainda assim concluiu que as suas observações é que não eram precisas o suficiente. Seu talento como matemático rendeu-lhe um convite para trabalhar ao lado de um nobre dinamarquês exilado em Praga, Matemático Imperial na corte de Rudolf II, chamado Tycho Brahe. Tycho Brahe era o maior astrônomo na época, e possuía os equipamentos mais avançados de astronomia e tinha feito as medições mais precisas dos astros na época. Apesar das muitas desavenças entre os dois, o contato com Brahe serviu de impulso para Kepler direcionar os novos rumos que daria para a Astronomia. Ao tomar conhecimento e analisar as minuciosas observações de Brahe em relação ao planeta marte, Kepler abandonou definitivamente a idéia de órbita circular, que mantinha até então e estabeleceu uma formulação matemática que o levou a órbita elíptica.
     De fato, Tycho possuía as observações astronômicas mais precisas do mundo. Resultado de 35 anos devotados à observação do céu antes da invenção do telescópio. Mas era um homem desleixado com sua saúde e suas pesquisas também. Extremamente rico, mas displicente com seus recursos. Acabou se arrependendo em seu leito de morte, quando doou suas observações a Kepler. Em 1601, com a morte de Tycho Brahe, Kepler substituiu-o no posto de Matemático Imperial da corte do rei Rodolfo II da Germânia, permanecendo nesse cargo até 1612. É o período mais vantajoso da vida de Kepler, época em que estabelece as duas primeiras leis dos movimentos planetários.
     Tycho havia feito observações intrigantes do movimento orbital de Marte. No céu, Marte vagarosamente executa um notável vai-e-vem contra o fundo das constelações. Uma órbita circular não se encaixava de jeito nenhum, embora desde o século VI a.C. filósofos como Platão e Pitágoras haviam assumido que os planetas, no seu ambiente puro, longe da corrupção terrena, só poderiam se mover seguindo a mais perfeita das formas: o círculo. Mas se a Terra era um lugar imperfeito, porque não seriam imperfeitos também os outros planetas, juntamente com suas órbitas? Foi pensando dessa forma que Kepler acabou aceitando o inevitável: o círculo se esticará em uma estranha forma oval. A regularidade e a perfeição de uma órbita circular eram afinal tão raras no Universo quanto a perfeição na índole humana.
    Quase em desespero, Kepler tentou a elipse, figura explicada pela primeira vez em manuscritos de Apolônio de Perga, na famosa Biblioteca de Alexandria. “Ah, que bobo tenho sido!” exclamou Kepler em suas anotações. A elipse, afinal, se ajustou maravilhosamente as observações de Tycho. Kepler descobriu que a órbita de Marte em volta do Sol era uma elipse e não um círculo. Assim como a dos outros planetas – embora a maioria elipses bem menos esticadas, isto é, quase círculos aos olhos de um observador desatento. Kepler foi mais longe. Percebeu que numa órbita elíptica um planeta aumenta a sua velocidade quando se aproxima do Sol, diminuindo quando se afasta, algo que também está de acordo com as observações práticas e se tornaria as duas das três Leis do Movimento Planetário: a Primeira Lei de Kepler, os planetas se movem em torno do Sol em órbitas elípticas, com o Sol num dos focos da elipse, e a Segunda Lei de Kepler, que para um mesmo intervalo de tempo as áreas desses arcos são idênticas, não importando a excentricidade da órbita, sou seja, sua trajetória varre áreas iguais em tempos iguais.
     Sentindo-se pouco seguro em Praga devido a conflitos políticos e religiosos, resolveu procurar outro local de trabalho. Em maio de 1612, após a morte da mulher, mudou-se para Linz, na Áustria, onde ocupou o cargo de matemático distrital e professor da escola local. Pouco depois outro fato veio lhe encher de preocupação. Sua mãe, em 1615, foi acusada de bruxaria e submetida a um longo processo judicial durante o qual chegou a ser submetida a tortura. Kepler envolveu-se com grande empenho nesse episódio, para livrá-la da condenação à morte. A libertação da mãe só aconteceu em 1621, mas seis meses depois ela viria a falecer.
     Apesar dos contratempos durante esses anos, Kepler prosseguiu com suas pesquisas e enunciou em maio de 1615, sua terceira lei: O quadrado do período (o tempo que eles levam para completar uma volta em torno do Sol) de qualquer planeta em torno do Sol é proporcional ao cubo da distância média entre o planeta do Sol, assim culminando seu trabalho com a publicação, em 1619, de sua obra mais importante, Harmonia dos mundos (Harmonice mundi). Embora tivesse cogitado que o sol, de alguma maneira, controlava o movimento dos planetas, ele não conseguiu estabelecer como se dava esse controle. Entretanto, suas três leis vieram concretizar a fundação de um cálculo astronômico inteiramente novo, abrindo caminho para que, 50 anos mais tarde, Newton pudesse estabelecer sua lei de Gravitação Universal. Anos mais tarde Newton viria a declarar: "Se enxerguei longe, foi porque me apoiei nos ombros de gigantes". Não declara exatamente quem seriam esses gigantes, mas Kepler certamente era um deles.
     Ele que mudou o mundo, que achou a verdadeira harmonia, morreu com 48 anos. Escreveu seu proprio epitáfio: " Eu medi os céus, agora estou medindo as sombras. A mente rumo ao céu, o corpo descansa na terra." Seu túmulo desapareceu durante a guerra.